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Estreia de Paul McCartney no Brasil, em 1990, teve até “Lula-lá”, e ele não entendeu nada

Paul McCartney está no Brasil. Nesta quinta-feira, 30 de novembro de 2023, aos 81 anos, inicia por Brasília uma série de oito shows pelo país. O último, no dia 16 de dezembro, será no Maracanã, Rio de Janeiro. Em 1990, na sua estreia brasileira, a dois meses de fazer 48 anos, Paul se apresentou no Maracanã nos dias 20 e 21 de abril.

Em 1990, não havia vendas online, porque a Internet ainda não existia, e você comprava seu ingresso – um cartão magnético – em postos espalhados por várias cidades ou através de agências de viagens. Os preços eram mais acessíveis, e o público não era segregado por seu poder aquisitivo. Um valor na arquibancada, outro no gramado. Não tinha esse negócio de premium e outras coisas mais.

Assisti aos dois show no Maracanã. No último, com 180 mil pessoas no estádio, fiquei diante do palco, e só precisei chegar às seis da tarde. Na coluna desta terça-feira (28), transcrevo texto que escrevi uns 10 anos depois e publiquei no meu livro de crônicas musicais Meio Bossa Nova, Meio Rock’n’ Roll. O livro é de 2001.

Os Beatles percorreram o mundo fazendo shows entre 1963 e 1966, mas nunca vieram ao Brasil. O público brasileiro teve que esperar até 1990 para ver um ex-beatle ao vivo. Mas valeu a pena: quando veio ao Rio de Janeiro, Paul McCartney trouxe um espetáculo grandioso e nostálgico em que, pela primeira vez na sua carreira-solo, cantava muitas músicas dos Beatles. No dia 21 de abril, sem a chuva que caíra na noite anterior, 180 mil pessoas foram ao Maracanã assistir à última das duas apresentações de Paul no Brasil, plateia que o colocaria no Guiness Book, já que, até então, nenhum artista reunira tanta gente pagando ingresso para ver um show num lugar fechado.

Uma série de clips montados por Richard Lester abre o show. Neles, o homem que levou os Beatles ao cinema em A Hard Day’s Night e Help!, reuniu imagens do grupo, da carreira-solo de Paul e de fatos marcantes dos anos 1960, 1970 e 1980. Tudo ilustrado com canções que emocionam os fãs. É um vídeo que dura cerca de 15 minutos e deixa o público pronto para ver McCartney ao vivo. Quando os telões são tomados pela palavra now e o palco se ilumina, Paul aparece com sua banda, cantando uma música nova, o rock Figure of Eight, que está no disco Flowers in the Dirt.

Ao vivo, o que se vê é um artista extraordinário. E generoso com seu público. São 30 canções em duas horas e meia de show, com uma banda eficientíssima e uma estrutura de palco invejável. No set list, sucessos da carreira-solo, novas músicas retiradas de um disco maduro (Flowers in the Dirt) e – o principal – as velhas canções dos Beatles. Lá estão baladas como Let It Be, The Long and Winding Road e Hey Jude, rocks como Can’t Buy Me Love, Back in the USSR e Get Back, um hit como Yesterday e aquele medley que fecha o Abbey Road. Mas há ainda Eleanor Rigby, Things We Said Today, The Fool on the Hll e Sgt. Pepper’s Loney Hearts Club Band, um programa que aproxima o espectador da mística do quarteto de Liverpool.

Paul McCartney é um símbolo vivo do maior de todos os grupos da era do rock e, junto com John Lennon, o pedaço mais importante do quarteto que mudou a face da música popular. Paul canta algumas das grandes canções dos Beatles, e a gente fica pensando no erro que milhares de fãs cometeram ignorando o talento dele depois da dissolução do grupo. Raciocinando como se os dois – John e Paul – jogassem em times adversários, quem fez a opção por Lennon passou a abominar o que McCartney produzia. E quem optou por McCartney, preferiu ignorar Lennon em sua carreira-solo.

No confronto com Lennon, um artista explicitamente envolvido com a vanguarda, tanto a estética, quanto a política, Paul sempre pareceu um conservador, mas é preciso ressaltar que ele não deixou de ser o músico talentosíssimo e inspirado melodista da época dos Beatles. E, longe do antigo parceiro, gravou discos muito bons. Além de ter mostrado, a partir dos anos 1980, que não era tão conservador quanto parecia, ao se engajar firmemente numa luta nobre como a da defesa dos animais e do meio ambiente.

No Maracanã, naturalmente, ele não entendeu nada quando a multidão cantou o refrão “Lula-lá”, lembrando a campanha eleitoral que levou Fernando Collor ao poder e, certamente, traumatizada com o confisco da poupança que o novo presidente acabara de decretar. Mas o ex-beatle fez questão de levantar a bandeira de grupos que defendem o meio ambiente (Friends of the Earth e Green Peace) e de pronunciar o nome de Chico Mendes, para quem compôs uma canção (How Many People), não incluída no roteiro do show.

Live and Le Die fica mais bonita por causa dos efeitos de iluminação. Em The Long and Winding Road (a gravação que está no álbum Tripping the Live Fantastic foi feita no Rio), a luz principal vem da plateia. O público acende os isqueiros e ilumina o estádio de futebol. Naquele momento, a gente presta atenção não só à balada que leva de volta ao final dos anos 1960, mas à reação das 180 mil pessoas que enchem o Maracanã.

Quase quatro anos depois, ao rever McCartney em São Paulo, enquanto ele cantava Let It Be, um desconhecido me ofereceu um isqueiro. Pude, então, me juntar aos milhares de fãs que levantavam os braços para iluminar o estádio do Pacaembu, participando de um dos rituais mais marcantes desses shows que reúnem as pessoas em grandes celebrações de música e alegria.

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Antes de entrar no livro Meio Bossa Nova, Meio Rock’n’ Roll, esse texto foi publicado na edição impressa do Jornal da Paraíba, em abril de 2001.

Agora, ao resgatá-lo, respeitei o original. Notem que a plateia iluminava o estádio com isqueiros. Ainda não havia os aparelhos celulares.

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