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O samba, o amor, o Rio e essa maravilha chamada Paulinho da Viola

Vi Paulinho da Viola ao vivo pela primeira vez numa noite qualquer do mês de setembro de 1975. Lá se vão 48 anos. Ele fazia parte de uma inacreditável caravana chamada Setembro, que, em João Pessoa, aportou no ginásio de esportes do Sesc, ali perto da Lagoa, e não conseguiu reunir mais do que 500 espectadores.

Era uma ônibus que viajava com um grupo de artistas num show coletivo: Paulinho, Moraes Moreira (que acabara de deixar Os Novos Baianos), Gonzaguinha (ainda longe do sucesso de Explode Coração), Fagner (que estava no segundo disco e não era tão popular), Sueli Costa, Armandinho do Trio Elétrico Dodô e Osmar.

Paulinho era o mais popular àquela época. “Tá, legal, eu aceito o argumento” – cantava no seu disco mais recente. No palco, aparecia sozinho ao violão. Ou tinha o auxílio luxuosíssimo do flautista Nicolino Cópia, o Copinha.

Quase meio século separa a caravana Setembro desse show dos 80 anos de Paulinho da Viola visto nesta quinta-feira, nove de novembro de 2023, em sua passagem pelo Teatro Pedra do Reino.

Nesses quase 50 anos, há muito Paulinho da Viola visto ao vivo. Há o show inesquecível dos álbuns Memórias (Cantando e Chorando), num Teatro Santa Roza com lotação esgotadíssima e gente sentada até pelos cantos do palco.

Há Paulinho mais uma vez no Santa Roza, com Canhoto da Paraíba como convidado; outra vez no ginásio do Sesc com seu show individual e não mais num coletivo; no Teatro Paulo Pontes, no tempo de Eu Canto Samba; diante de uma multidão no Ponto de Cem Réis; ou, bem mais tarde, já no novíssimo Teatro Pedra do Reino.

Nesses anos todos, há algumas conversas, por vezes longas. Na redação de A União, em hotéis, camarins. Até numa precária Kombi do Sesc a caminho de uma passagem de som; ou num jantar improvisado depois de um show igualmente improvisado durante a entrega de um prêmio ao mercado publicitário.

Fui juntando esses pedaços de Paulinho da Viola para ter o Paulinho da Viola que enxergo por inteiro. Junto do “ao vivo”, há o artista dos discos que gravou, soberbos, principalmente aquela série de LPs da velha Odeon, espalhados lá pela década de 1970.

Esse show que agora comemora seus 80 anos – neste domingo, 12 de novembro, faz 81 – não é muito diferente do anterior, que passou por aqui em 2016, no mesmo Pedra do Reino. É, para nós, os espectadores, o retrato do artista tirado depois da extensa trajetória. Ou o autorretrato que o arista oferece ao seu público.

É ainda mais sereno do que Paulinho tem sido em sua vida de artista. O compositor e intérprete do seu cancioneiro vendo tudo de longe. Cantando seus sambas, contando suas histórias, prestando tributo aos seus mestres, revisitando suas fontes, suas raízes.

Paulinho da Viola é Portela. Hermínio Bello de Carvalho, agora com 88 anos, é Mangueira. A letra é de Hermínio, a melodia é de Paulinho. O samba Sei Lá, Mangueira vem dos anos 1960. Um compositor da Portela dividindo uma música com um poeta apaixonado pela Mangueira. As divergências dizendo, juntas, que elas – as divergências – podem, sim, estar juntas.

Há 50 anos, quando eu ouvia Sei Lá, Mangueira com Elizeth Cardoso, meus olhos se enchiam de lágrimas, mas nada me ocorria sobre o diálogo entre divergentes. Tantos anos depois, esse samba de bela melodia e doce poesia me comove porque me faz pensar nesse Brasil irremediavelmente cindido entre lulas e bolsonaros.

Sei Lá, Mangueira traz a lembrança do tão esquecido Hermínio Bello de Carvalho e conduz, talvez, às muitas belezas que há em Paulinho da Viola. É, no set list desse show, uma das sínteses possíveis da sua cordialidade, da sua tão mencionada elegância.

O show dos 80 anos percorre a carreira de Paulinho da Viola com números obrigatórios (Sinal Fechado, Coisas do Mundo, Minha Nega, Argumento, Foi um Rio que Passou em Minha Vida, Coração Leviano), um ou outro lado B, como Roendo as Unhas, esse samba estranhamento belo, e o intérprete de Cartola (Acontece) e Lupicínio Rodrigues (Nervos de Aço).

No final, há, no breve canto à capela, a sempre justa e necessária homenagem a Clementina de Jesus. É como o artista que canta o samba, o amor e o Rio de Janeiro se despede da gente. Paulinho da Viola é uma das maravilhas do samba. Paulinho da Viola é uma das maravilhas do Brasil.

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