RETRO/2024 foi o ano da turnê de Caetano Veloso e Maria Bethânia
Texto publicado originalmente no dia 28/10/2024.
No começo do show, depois da abertura com Alegria, Alegria, tem Os Mais Doces Bárbaros, que é de 1976, do ano em que Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Maria Bethânia saíram em turnê para celebrar a música e a amizade deles.
Perto do final do programa, tem Tudo de Novo, que é de 1978, do repertório do show que Caetano Veloso e Maria Bethânia fizeram naquele ano e que se transformou num álbum gravado ao vivo no Canecão, Rio de Janeiro.
“Com amor no coração/Preparamos a invasão/Cheios de felicidade/Entramos na cidade velha” – diz a letra de Os Mais Doces Bárbaros.
“Meu povo, sofremos tanto/Mas sabemos o que é bom/Vamos fazer uma festa/Noites assim, como esta/Podem nos levar pra o tom – diz a letra de Tudo de Novo.
As duas canções têm quase a mesma idade, mas, no show de agora, uma está no começo, e a outra está no fim do repertório. Uma abre, a outra fecha. As duas comentam a vida de artista dos irmãos Veloso e o vínculo profundo que construíram com o público.
Caetano Veloso e Maria Bethânia estão em turnê pelo país. Sexta-feira (25/10) e sábado (26/10), passaram pelo Recife em duas apresentações no Classic Hall.
Caetano Veloso tem 82 anos, completados em agosto. Maria Bethânia tem 78 anos, completados em junho. O show olha para a carreira deles em retrospecto. Tem beleza singular e uma força que nos emociona e comove.
Caetano Veloso é o principal autor das canções apresentadas no show. A evocação da juventude, na segunda metade da década de 1960, e do movimento tropicalista – isso aparece em Alegria Alegria, Tropicália, Não Identificado, Baby.
Essas canções passaram pelo teste do tempo, da permanência, e estão crescendo à medida em que envelhecem. Crescem porque se tornaram ainda maiores e ainda mais bonitas do que já eram na época em que foram lançadas.
Gente, Oração ao Tempo, Um Índio, Cajuína, O Leãozinho, Odara – essas são da década de 1970. Um Índio permanece assustadoramente atual. Gente tem o verso que resume tudo nesse Brasil desigual: “Gente é pra brilhar/Não pra morrer de fome”.
Você é Linda, O Quereres, Vaca Profana, Milagres do Povo e Reconvexo já são dos anos 1980. O Quereres é extraordinário exercício poético de Caetano. Vaca Profana, com sua pegada rock’n’ roll, faz homenagem a Gal. Milagres do Povo tem tanto o ateu que há em Caetano quanto o que há em Jorge Amado.
Caetano Veloso sempre foi um grande performer. Maria Bethânia é ainda mais. Um dos pontos altos do show é quando ela, sozinha no palco, apresenta um set “matador” de sucessos de sua carreira.
Brincar de Viver (Guilherme Arantes), Explode Coração (Gonzaguinha), As Canções que Você Fez Pra Mim (Roberto e Erasmo Carlos,) Negue (Adelino Moreira) e Vida (Chico Buarque) são as escolhas certeiras.
Essa sequência mostra porque, há décadas, Maria Bethânia é Maria Bethânia, com toda a expressividade do seu canto e o incrível domínio que tem do espaço cênico. A plateia recebe em êxtase essa sequência de canções tão populares.
Quando está sozinho no palco, Caetano Veloso canta o gospel Deus Cuida de Mim, do pastor Kleber Lucas. A plateia não tem reagido bem a esse número, mas, com coragem e lucidez, o que Caetano quer dizer é que não é mais possível pensar o Brasil contemporâneo sem considerar o crescimento do segmento evangélico.
Voz e violão, em Sozinho, de Peninha, Caetano magnetiza o público num dos momentos mais fortes do show. Também é o intérprete que está em cena em Você Não me Ensinou a te Esquecer, de Fernando Mendes, gravada para o filme Lisbela e o Prisioneiro.
“Aqui é o fim do mundo/Aqui é o fim do mundo” – Marginália II dá conta do Brasil de 1968 e traz Gilberto Gil para o repertório. Tão importante na história do carnaval da Bahia, Filhos de Ghandi é homenagem explícita a Gil.
Sei lá, Mangueira não é escolha óbvia. Caetano canta esse samba lindo de Paulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho abrindo o tributo à Mangueira.
“Belo é o Recife pegando fogo/Na pisada do maracatu” – um pequeno trecho de Festa, do jovem Gonzaguinha, celebra o amor pela cidade e enche de orgulho os recifenses.
Por duas horas e com 40 músicas, o show tem caráter de antologia e é uma espécie de autorretrato de Caetano Veloso e Maria Bethânia. Também é sobre o diálogo profundo do Brasil com a sua música popular. O que nos arrebata é que esse conjunto de canções faz parte da vida da gente.
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O REPERTÓRIO DO SHOW:
Alegria, Alegria
Os Mais Doces Bárbaros
Gente
Oração ao Tempo
Motriz
Não Identificado
A Tua Presença
13 de maio
A Donzela se Casou
Samba de Dois Rios
Milagres do Povo
Filhos de Ghandi
Dedicatória
Eu e Água
Tropicália
Marginália II
Um Índio
Cajuína
Sozinho
O Leãozinho
Você Não me Ensinou a te Esquecer
Você é Linda
Deus Cuida de Mim
Brincar de Viver
Explode Coração
As Canções que Você Fez pra Mim
Negue
Vida
Sei Lá, Mangueira
A Menina de Oyá
Exaltação à Mangueira
Onde o Rio é Mais Baiano
Baby
Vaca Profana
Gita
O Quereres
Fé
Reconvexo
Tudo de Novo
Festa
Odara